sábado, abril 07, 2007

Santa Páscoa

Estive durante a Semana Santa, numa cidade milenar do sul de Espanha. Cidade que já viu passar por si, a o decorrer impávido dos anos, sangrentas mudanças do poder, culturas que se foram absorvendo, e a glória de várias civilizações que se foram substituindo à medida que decaíam e eram embutidas naquele aglomerado de gentes, do que já foi, do que é e, do que é eterno.

O que mais me impressionou foram, as procissões da Semana Santa, organizadas pelas Confrarias de Penitentes locais. Procissões imponentes que duravam largas horas, várias por dia e todos os dias da semana (excepto quando chovia). Procissões em que participavam centenas de penitentes, e que eram contempladas por largos milhares de pessoas que se estendiam pacientemente, muitas vezes horas antes da procissão começar, ao longo do percurso programado pelas pequenas ruas repletas de História e pela “Carrera Oficial”.

No meio deste impressionante desfile de fé e paixão pelas ruas, impunham-se os espectaculares andores ou “piendentes del cielo”, representando várias cenas da vida de Jesus Cristo ou Nossa Senhora. Cada confraria tem os seus paramentos, que diferem em alguns pormenores e nas cores dependendo do dia da Semana, e devo-vos dizer que são simplesmente, impressionantes, no seu conjunto, na sua beleza, na sua singularidade. Vestem-nos os “Nazarenos” ou penitentes, sendo que os homens que transportam os andores (à volta de 30 ou 40 dependendo do tamanho dos “piendentes”) andam com um pano a tapar a cabeça apenas, em sinal de respeito, e de vez em quando revezam-se. Tudo coordenado por um Grão-mestre e complementado pelas crianças que se iniciam e que ainda não andam de cara tapada, mas transportam os incensos, velas, e outros acessórios que requerem substituição periódica.

Mas o que mais me impressionou, mais do que toda esta imponência comovente da expressão da religião, foi a entrega com que todos, dos mais velhos aos mais novos, transmitida abertamente de pais para filhos, em toda uma tradição constantemente renovada nas velhas lajes daquelas ruas e perpétuada nos corações de cada um, exuberante mas sobriamente, ano a ano, se dão à sua religião. Sem vergonhas, sem medos, sem preconceitos, sem recear serem julgados ou gozados, mas sim com verdadeiro orgulho e amor a Deus! Nas ruas, dos balcões das janelas cobertos de ricos panos, adoram as imagens numa oração meditativa ou detendo a procissão enquanto se desfiam em belas “Saetas” (orações únicas cantadas, transmitidas de pais para filhos. Arte restrita a um número reduzido de pessoas), respondidas pelo andor e aplaudidas com júbilo pela população que as escuta com emoção. Tudo acompanhado ao ritmo maravilhoso de bandas exemplares e impecavelmente bem vestidas, nos seus uniformes de gala. Até o exército tem a sua própria confraria... E é aqui, meu Portugal, que perdes grandemente para com Espanha.

Durante anos, sob o signo dos mais variados governos republicanos e democráticos, sob a influência, ela sim castradora, da maçonaria, a força da Igreja foi sendo minada, as suas bases foram sendo lentamente desfeitas, e todas estas celebrações se foram esfumando com o tempo, tendo hoje desaparecido ou tornando-se em pálidas sombras do que foram outrora, lutando com a idade dos que teimam em as manter vivas (como no caso noticiado, dos cantores de orações de Braga). A culpa, diga-se, também é das chefias religiosas, pois sob um manto aparente que pretenderam dar de simplicidade, populismo e pobreza para não serem alvo de grandes atenções no pós-25 de Abril, acabaram por deixar esbater-se toda a verdadeira grandeza da Santa Igreja Romana Apostólica e Cristã. Acusada de ser cinzentona, triste, sem grande interesse nos dias de hoje e ultrapassada, a Igreja ao abdicar dessas manifestações públicas da sua grandeza e esplendor, proclamando e revelando a fortaleza do poder da fé, sucumbiu gravemente a essas deturpações dos seus inimigos. Espanha não. E é por isso que no país vizinho, estas tradições estão mais vivas que nunca, e existem mais de 80 % de católicos praticantes! A nossa Igreja teve medo, teve vergonha, quis esconder-se para sobreviver, quis renegar o seu papel e renunciar a publicidade ao seu papel fulcral e essencial na nossa sociedade, e por isso quase que morreu.

Impera a recuperação de toda a riqueza, de toda a alegria, de todo o poder divino da fé, acabando com esta apatia religiosa e este ateísmo enganador e debilitante, restaurando este pilar vital da nossa civilização ocidental!

Santa Páscoa a todos!


(Fotografias gentilmente cedidas por: Francisco Nobre)

1 comentário:

Anónimo disse...

Uma Santa Páscoa também